27 de dezembro de 2009

Samba-Rock: A Arte Paulistana de Trançar os Braços

A primeira vez que ouvi falar em samba-rock foi em junho de 2007, quando li a dissertação de Vagner Rodrigues1. Estive em Sampa em novembro de 2007 e em junho de 2008, mas não consegui descobrir os seus “esconderijos dançantes”. Os paulistanos praticantes de dança de salão sabiam da sua existência, mas não faziam idéia de onde se poderia dançá-lo. É curioso imaginar que uma dança apreciada e dançada por milhares de paulistanos seja desconhecida no Brasil e também na própria cidade, tendo sido ignorada pelos meios de comunicação por quase quatro décadas.

E assim ele continuou para mim como uma “referência teórica” até agosto deste ano, quanto tive eu primeiro contato “físico”. Isso só foi possível graças à comunidade Eu Danço Samba Rock do Orkut (bendito Orkut!). Tomei a liberdade de me apropriar de informações da referida dissertação, inserindo minhas experiências pessoais para escrever este texto, uma forma que encontrei para homenagear essa manifestação da cultura popular paulistana e que dedico a todos os membros da comunidade, pelo carinho com que me receberam e pela paciência em responder as minhas muitas perguntas.

O samba-rock é fruto de uma mistura entre o samba e o rockabily. Ele surgiu na década de 60 nos bairros com alta concentração de população negra da capital paulistana. É preciso que fique claro que O SAMBA-ROCK É UM JEITO DE DANÇAR e não um gênero musical. Reza a lenda que tal forma de dançar surgiu quando tocaram um arranjo “sambeado” que Valdir Calmon fez para a música Rock Around The Clock, de Bill Haley. “O pessoal ficou confuso, não sabia se dançava rock, se dançava samba. Então, partiram para dançar rock, só que com outro jeito. Eles trançavam os braços como no rock, só que nos pés eles criaram um swing diferente”.1

O nome “samba-rock” só apareceu nos anos 70, quando os bailes eram divididos em branco e black. Nos primeiros tocavam as orquestras e, devido ao valor dos ingressos, freqüentado pela elite social. Já nos bailes black, as músicas, bastante variadas, eram tocadas em toca-discos de vinil, o que os tornava mais acessível à população. Assim como acontece com o soltinho e o lambazouk, ele aceita um repertório bastante variado, que inclui swing, rithm blues, jazz, partido alto, baladas dos anos 60, country, mambo e até bossa nova.

As músicas usadas nas trilhas sonoras dos bailes não foram compostas para o samba-rock. Curiosamente, a maioria de seus compositores e cantores jamais ouviu falar em samba-rock, apesar de sua música fazer sucesso nesses bailes. A construção da trilha sonora dos bailes de samba-rock é atribuída aos DJs, profissionais que até hoje pesquisam sonoridades musicais possíveis de serem dançadas como samba-rock, como Tony Hits, Loo, Grego, Miriti, Tadeu e Paulão. A partir de 2000 surgiram as bandas de samba-rock, que hoje compõe especialmente para o público dançante, como Clube do Balanço, Na Esquina, Sambasonics, Farofyno, Sandália de Prata e Os Opalas.

Em agosto de 2009 tive a oportunidade de conhecer “corporalmente” um pouco desse universo paulistano. Primeiramente fui ao Hotel Cambridge, onde Às quartas-feiras acontece o Clube do Samba Rock, projeto que une as aulas de samba rock dos professores Moskito, Marcelo Male e Willian Diaz em parceria com o DJ Tony Hits no comando das pickup e que, para o meu deleite, comemorava o seu terceiro aniversário (com direito a bolo e parabéns!). Animadíssima com a experiência no dia seguinte fui a uma aula na Vitrine da Dança da Galeria Olido. Terminada a aula, fui direto para o Shopping Light, tendo sido a primeira a chegar para o tão esperado encontro com a turma sambaroqueira da comunidade orkutiana.

Diferente de tudo que já experimentei nas danças sociais a dois, no samba-rock todo o corpo se adapta em função do deslocamento das mãos e dos braços. Através dos giros e rodopios (quando o corpo gira e ao mesmo tempo se desloca lateralmente), os braços do casal se cruzam e se torcem de diversas maneiras; nós são feitos e desfeitos com torções e enlaces que acontecem no tronco, no pescoço e no quadril. As articulações dos braços, ombros, mãos e dedos se dobram e redobram, chegando ao máximo grau de entrecruzamento, para, logo em seguida, se desfazerem com novos rodopios e desenlaces.

Estes movimentos acontecem sem interrupção e compõem continuamente um mosaico de figuras móveis que se interpenetram umas nas outras. O tronco se torce à frente, atrás e ao lado, com curvas que dão aos braços maiores possibilidades de encaixe. Toda a condução dos passos se dá pelo leve contato entre as superfícies das mãos, que deslizam umas nas outras como eixos e dão às articulações dos braços e ombros graus de liberdade que favorecem seus enlaces e permitem os giros e rodopios do corpo.

Outra peculiaridade do samba-rock: sua base de deslocamento se dá em sentido oposto (isso mesmo, enquanto um vai para a esquerda, o outro vai para a direita). A mulher se desloca lateralmente, afastando e unindo as pernas, ou rodopiando seu corpo e marcando o compasso da música em quatro tempos. Com esta base rítmica (que geralmente não se altera do início ao final da música), ela se desloca à frente, atrás e ao redor do homem. Ele se desloca no sentido contrário ao movimento dela, transferindo e variando os apoios dos pés sem necessitar acompanhar a cadência do tempo musical da mesma forma que ela. Com movimentos à tempo e à contratempo, o homem se aproxima e se distancia, gira em seu eixo corporal, rodopia e se desloca ao redor dela.

Em conseqüência disso é muito difícil ser pisoteado num baile de s

ambar-rock. Em compensação...HAJA CASCUDO! De cotovelo, mão e até cabeça. Sem contar os momentos de angustia em que seu parceiro “some” atrás de você ou naqueles em que você sente vai dar um nó de marinheiro com os braços, mas...não é que deu tudo certo, como se fosse a coisa mais óbvia do planeta? E isso tudo acontece em deslocamentos de mesma duração de tempo, ou seja, sem pausa. Haja fôlego! Atualmente coexistem pelo menos quatro estilos de samba-rock: o “tradicional” ou “das antigas”, o “trançado”, o “estrela” e o “refinado”.

A história do samba-rock ainda está nos chamados “bailes da nostalgia”, freqüentados por pessoas da periferia na qualidade de uma opção de lazer. Entretanto, a partir de 2000 o samba-rock ganhou espaço também nas baladas freqüentadas pela classe média, em lugares como o Graze a Dio, Di Quinta e Mood Club e nas escolas de dança. Antes disso, “as pessoas treinavam em casa, chegando até mesmo a utilizar a porta como parceira. Empurrando a porta de um lado a outro os homens simulavam o deslocamento da mulher durante a dança. Outro aparato utilizado eram as argolas que puxavam as cortinas. As duas argolas simulavam os braços da mulher”. 1

Conhecer o samba-rock é uma forma de conhecer São Paulo por um outro viés. É uma história que fala do não-conhecido, do não-oficial e que, justamente por isso, representa um traço cultural da cultura paulistana.1 O contato com esse universo, embora tão curto, foi suficiente para ganhar minha simpatia e adesão. Desse momento em diante o samba-rock será sempre incluído nas minhas visitas a Sampa.

REFERÊNCIAS

1. RODRIGUES, Vagner. Fora da Mídia e Dentro do Salão: Samba-Rock e Mestiçagem. São Paulo: PUC (dissertação de mestrado), 2005.

SITES RELACIONADOS

http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=3383099

http://sambarocknaveia.blogspot.com/

http://www.sambarock.com.br/

http://www2.uol.com.br/tonyhits/index1.html

http://www.professormoskito.com.br/

Trançando os Braços no Samba-Rock

Demonstração de samba rock com Claudio Nostalgia e Erika Alves no Clube do Samba Rock, projeto dos professores Moskito, Magoo, Cláudio em parceria com o DJ Tony hits (SESC Araraquara/SP).

24 de dezembro de 2009

Projeto Diálogos no Escuro: metodologia não visual para as Danças Sociais a Dois

A visão se apresenta na nossa realidade física e social como o sentido de maior importância na captação de estímulos e projeções espaciais. Estima-se que aproximadamente 80% de nossa percepção do mundo seja visual. Durante muito tempo acreditou-se que a cognição dependia essencialmente da visão, ou seja, de que era imprescindível ver para aprender. 1

O meu desejo de experimentar metodologias não visuais para o ensino da danças sociais a dois surgiu pela primeira vez durante um exercício de improvisação por contato no Curso de Aperfeiçoamento para Professores de Dança de Salão promovido pelo Centro de Dança Jaime Aroxa (RJ) em 2002, quando foi solicitado aos participantes que fechassem os olhos. Percebi que a privação da visão aguçou os meus outros sentidos, principalmente o tato. Desse dia em diante, passei a adotar como prática fechar os olhos enquanto danço.

Em novembro de 2007 visitei o Museu do Diálogo (Campinas/SP), projeto do alemão Andreas Heinecke que proporciona a indivíduos videntes a vivência de situações cotidianas em uma área completamente escura. Durante uma hora e meia os visitantes, com auxilio de uma bengala-guia, percorrem os cinco ambientes da instalação, experimentando as diferentes sensações de vento, odores, temperaturas, sons e texturas, ao mesmo tempo que se confrontam com suas próprias limitações. E a melhor parte da história: cada grupo é guiado por um deficiente visual, que NÃO USA BENGALA DURANTE O TRAJETO!

Entrei sozinha, tensa, braço direito arrastando na parede, braço esquerdo esticado segurando a bengala-guia o mais longe possível, concentrada em não tropeçar. Encontrei meu guia lá dentro e juntos atravessamos um bosque (com árvores e chão de terra), uma mini-cidade (com direito a chão esburacado, semáforo e buzinas de carros), um lago (num simulador de barco) até chegar ao penúltimo ambiente, uma sala acarpetada onde meu guia sugeriu que eu relaxasse. A esta altura meu êxtase era tamanho que eu soltei a bengala e dancei! Com cautela, porém sem medo. Depois partimos para o Diálogos no Escuro, um bar onde se pode comprar bebidas e petiscos para beliscar durante o bate-papo com o guia.

Esta inesquecível experiência foi determinante para fortalecer em mim o desejo de desenvolver uma metodologia destituída do recurso da imitação visual, promovendo assim uma maior utilização dos demais sentidos corporais nas danças sociais a dois, o que veio a se concretizar durante o módulo Arte como Tecnologia Educacional II, do curso de Licenciatura em Dança da Universidade Federal da Bahia, sob a forma de uma breve atividade extencionista orientada. O Projeto “Diálogos No Escuro - Metodologia Não Visual para o Ensino das Danças de Salão” foi construído em parceria com Cristiane Passos e Daniele Denovaro. Escolhemos trabalhar com portadores de deficiência visual para que a impossibilidade de imitação visual destas pessoas nos motivasse a investigar procedimentos metodológicos não visuais (especialmente táteis-cinestésicos, auditivos e metafóricos).

A deficiência visual é definida como a perda ou redução da capacidade visual em ambos os olhos em caráter definitivo, que não possa ser melhorada ou corrigida com o uso de lentes, tratamento clínico ou cirúrgico. 2 Entretanto, no âmbito social a cegueira tem um sentido de invisibilidade maior do que de escuridão. A desorientação espacial provocada pela privação da visão prejudica a mobilidade do deficiente visual, fazendo com que a sociedade o considere desajeitado e inábil para diversas atividades. Por orientação espacial entende-se a “capacidade de reconhecimento da posição corporal em relação com todos os objetos significativos do seu meio circundante” e por mobilidade a “capacidade de deslocamento do ponto em que se encontra o indivíduo para alcançar outra zona do meio circundante”. 3

O projeto aconteceu durante as quatro quartas-feiras do mês de novembro de 2008 no Centro de Apoio Pedagógico ao Deficiente Visual (CAP), no bairro de Nazaré (Salvador/BA), fundado em 1998 e subordinado à Secretaria Estadual de Educação. As aulas de danças de salão se iniciaram em 2004 como iniciativa voluntária e espontânea do professor Fábio Martins. Desde abril de 2008 a atividade foi assumida por Gilmara Carvalho, professora e dançarina da Academia Baiana Dança de Salão, que gentilmente nos cedeu suas aulas durante o mês de novembro.

As aulas tiveram, em média, 11 participantes, na faixa etária de 40 a 65 anos, com um pequeno excedente de homens. O grupo mostrou-se bastante inquieto e falante, com percepção tátil-cinestésica e auditiva aguçada. A utilização de metáforas do cotidiano se revelou de grande eficiência como procedimento metodológico. Nos exercícios que propunham deslocamento aconteceram choques que permitiam o reconhecimento entre os participantes (através do toque e da fala), resultando em saudações amistosas.

Apesar do pouco tempo, pudemos perceber a evolução da turma, com abertura para a desconstrução de alguns tabus em relação à detenção do poder de escolha (condução), a necessidade de se ter um corpo específico, uma postura pré-concebida e uma consciência rítmica adequada para a dança. Em momento posterior, alguns participantes referiram grande satisfação pelo sentimento de superação. Para nós, facilitadoras, o projeto foi um exercício pedagógico importante. Esperamos que ele tenha contribuído para o desenvolvimento motor e psico-social dos participantes.

REFERÊNCIAS

1. OLIVEIRA, João Vicente Ganzarolli. Arte e Visualidade: A Questão da Cegueira. Disponível em http://www.ibc.gov.br. Acesso em 16/10/2008

2. http://www.ibc.gov.br. Acesso em 14/10/2008

3. SANTOS, Admilson. O Cego, O Espaço, O Corpo e O Movimento: Uma Questão de Orientação e Mobilidade. Disponível em http://www.ibc.gov.br. Acesso em 16/10/2008

23 de dezembro de 2009

Gafieira com os Gêmeos Geniais

Eu com meus queridos e geniais amigos Isac e Isaias Silva sem medo de experimentar na gafieira durante o baile-aula do ASBAC. Meninos, eu amo a irreverência de vocês!

21 de dezembro de 2009

Teste dance-drive da minha nova sandália

Unindo o útil (o piso da sala da Escola de Dança da UFBA) ao agradável (a competência de Marcos Affonso) para testar minha nova e linda sandália Vizzano. Aprovada com restrições de piso e ritmo! (rsss)

Zouk com Paulinho

Esse clip é uma homenagem a este parceiro de zouk maravilhoso, sempre disposto a experimentar novos movimentos a partir do improviso. Que os belgas o recebam de braços abertos e disfrutem o seu talento. Um grande abraço e até a volta!

21 de novembro de 2009

Tamanho Único: ajuste-se a ele!

TAMANHO ÚNICO é uma proposta de instalação interativa inspirada nas “disciplinas” de Michel Foucault que utiliza elementos das danças de salão para compor um ambiente de “fabricação de indivíduos úteis e dóceis”.

Durante aproximadamente uma hora todos os elementos da instalação estarão disponíveis à interação dos visitantes, inclusive as quatro "peças vivas", sob a forma dos dançarinos e co-criadores Evie Souto, Jonas Karlos, Jocélia Freire e Marcelo Galvão.

Esta é a minha proposta para o XIV Painel Performático da Escola de Dança da UFBA enquanto aluna ouvinte da disciplina Laboratório de Corpo e Criação II.

Dia 24 de novembro de 2009, das 19h30 às 20h30, sala 10 da Escola de Dança da UFBA (Campus de Ondina, Salvador, Bahia)

17 de novembro de 2009

JAM - CONTATO IMPROVISAÇÃO EM SALVADOR

Conheci o contato de improvisação nas JAM que aconteciam no Anexo do Teatro XVIII, no Pelourinho, geralmente nos últimos sábados de cada mês. Esse clipe foi feito na Escola de Dança da FUNCEB, umas das últimas JAMs que fui. Inclusive, sou eu cantando durante um momento. Saudades!

11 de novembro de 2009

Praticando samba de gafieira II

Evie Souto e Marcos Afonso trocando idéias e praticando samba de gafieira na Escola de Dança da UFBA

Praticando samba de gafieira I

Evie Souto e Marcos Afonso praticando e trocando idéias sobre samba de gafieira na Escola de Dança da UFBA

3 de agosto de 2009

Contato de Improvissalão

Investigações coreográficas sobre contato de improvisação e danças de salão desenvolvida por Evie Souto e David Iannitelli durante o segundo semestre de 2008. Participações especiais de Diane Portela e Gil de Souza.

29 de julho de 2009

Aulas na UFBA em recesso

As aulas na UFBA estarão suspensas até dia 18 de agosto, devido às reformas na Escola de Dança e também porque estarei em São Paulo no período de 08 a 18 de agosto. Em breve divulgarei qualquer mudança de dias ou horários. Um bom inverno a todos!

10 de junho de 2009

Experimento "Discursos habitam Corpos"

A PROPOSIÇÃO
A concepção binária e naturalizada da humanidade é uma disposição do mundo moderno. Ser sexuado é estar submetido a um conjunto de regulações sociais situado como principio formador do sexo, gênero e desejo. As danças de salão são configurações binárias em suas coreografias e discursos. Tradicionalmente executadas por duas pessoas do sexo oposto, onde pertence ao homem o poder de decidir sobre a seqüência de movimentos, sua forma rítmica, direção e velocidade de deslocamento. A mulher deve estar apta a compreender as solicitações do seu parceiro, desenvolvendo os movimentos correspondentes.
O formalismo glamoroso das regras de etiquetas tem preservado a erotização da dominação masculina e as hierarquias de gênero nas danças de salão. Romper e construir novos significados para os gêneros, deslocar a sexualidade da matriz heterossexual é estar em risco.Para a Teoria Queer, o socialmente real é criado por atos de repetição dos sujeitos, concebidos como efeito de uma multiplicidade de processos de socialização, onde obtêm a sua condição "masculina" ou "feminina" como produtos histórico-sociais.
A palavra queer designa algo ou alguém desestabilizador da ordem social estabelecida. Esta pesquisa propõe investigar as estratégias binárias nas coreografias e discursos das danças de salão que criam e sustentam seu modelo masculinista e heteronormativo de poder, buscando frestas para desestabilizá-lo. A partir dessa reflexão teórica foi proposta uma investigação corporal e coreográfica para a turma 03 da disciplina Laboratório de Corpo e Criação Coreográfica I do curso de Lincenciatura em Dança da UFBA, da qual sou aluna em regime especial que, sob orientação dos professores Antrifo Sanches e Fernando Passos, discute o tema corpo, gênero, sexualidade e performance.
O EXPERIMENTO
1. Alongamento livre (10’)
2. Distribuição dos discursos aos participantes, solicitando sigilo absoluto sobre o conteúdo dos mesmos (5’);
3. Exibição de vídeo sem áudio editado com trechos de coreografias de forró, tango, mambo, lambazouk, bolero e samba de gafieira para observação das estratégias coreográficas utilizadas (15’);
4. Experimentação coreográfica dos discursos: iniciar caminhando individualmente pela sala. Ao comando DUPLA formar um par e improvisar uma dança a dois, considerando o discurso recebido. Ao comando SOLO voltar a caminhar individualmente pela sala. Promover troca de duplas até que todos dancem com todos, se possível (25’);
5. Para cada participante solicitar a opinião do grupo sobre como foi dançar com ele(a) e especular sobre qual seria o seu discurso e as estratégias coreográficas utilizadas por ele(a). Após opinião do grupo o participante revela o discurso recebido e os recursos coreográficos escolhidos para representá-lo (tempo máximo estimado 35’).
6. Leitura dos trechos para reflexão e abertura das discussões em grupo (até 40’).
OS DISCURSOS
Foram selecionados 17 discursos coletados de falas verídicas de praticantes das danças de salão durante festas em Salvador, havendo sofrido pequenas adaptações para melhor compreensão dos mesmos. Das quatorze pessoas presentes, doze dançaram e dois observaram (Fernandinho e Natália Rosa). As imagens editadas estão disponíveis no youtube (ver postagem anterior) Seguem abaixo os discursos na íntegra e seus respectivos intérpretes:
1. Inicialmente me deixo conduzir. Entretanto, fico atento aos momentos propícios para roubar a condução sem aviso prévio, devolvendo-a quando estiver satisfeito e ver como o outro reage a este “imprevisto”. (Alana)
2. Nas danças de salão a condução sempre pertenceu ao homem e é assim que deve continuar sendo. Mulher que se mete a conduzir na dança é porque quer dar uma de homem. (Diego)
3. A mulher no baile é uma espécie de rainha, de diva: joga o cabelo, insinua-se, provoca. O homem pode responder com um atrevido avanço de quadril. A ousadia é a marca do macho; mostrar poder e dominar a cena é a da fêmea.(Simone)
4. Só me deixo conduzir por homens ou por mulheres vestidas de homens. (Mayana)
5. Só conduzo mulheres, pois se tentar conduzir um homem e der errado e a culpa vai ser minha. (Maria Paula)
6. A idéia de ser conduzido o tempo todo por alguém de forma silenciosa, sem ter direito de propor também o que eu tenho vontade me oprime. Me sinto usado. (Joélia)
7. Exijo que pessoa que estiver dançando comigo esteja atento às minhas vontades. Caso contrário encontro uma maneira discreta de sabotar a dança para que meu par se sinta culpado pelo erro que eu provoquei. (Ana Flávia)
8. Nas danças de salão o homem, por mais gay que ele seja, não deve ficar inventando muita coisa: nada de rebolar muito, desmunhecar, jogar cabelo...Seu papel é se manter firme para que a mulher não se desoriente. (Victor)
9. Tem movimentos que são exclusivamente femininos. Quando um homem tenta fazê-los fica meio gay, parece que quer competir com a mulher para ver quem aparece mais. (Joline)
10. Na dança de salão, o homem tem uma série de obrigações, como cuidar da mulher, planejar o rumo, variar os passos, segurar com firmeza e orientar delicadamente o corpo de uma mulher. A mulher fica mais livre para desfrutar o baile, basta escolher um bom parceiro que a faça brilhar. (Antrifo)
11. Mesmo sendo homossexual não sinto falta de dançar alguém do mesmo sexo que eu, pois gosto é da junção de dois corpos diferentes para uma proposição. (André)
12. Nas danças de salão existe um dialogo aonde um conduz e o outro permite essa condução, contando que seja definido antes quem vai conduzir quem. (João Miguel)
OBSERVAÇÕES
Este experimento estava previsto para acontecer no dia 18/05. Mas, devido às fortes chuvas que assolaram a cidade, aconteceu no dia 25/05, após do de Joline. Dessa forma, achei não haver necessidade de novo alongamento e iniciei com a distribuição dos discursos. Embora solicitado silêncio durante a exibição do vídeo, a concentração foi quebrada algumas vezes pelo grupo, provavelmente devido a agitação do laboratório anterior.
Durante a experimentação coreográfica em duplas pode observar a utilização de alguns movimentos exibidos no vídeo. Atribuo o estado de agitação dos participantes-dançantes à agitação do experimento anterior, pois na maior parte do tempo pareciam estabelecer uma relação de conflito ao invés de parceria. Devido à preocupação com o tempo, não foi possível todos dançarem com todos.
Na etapa seguinte formou-se uma roda, e elegi um integrante, perguntando ao grupo como foi dançar essa pessoa, se era possível deduzir qual o discurso que havia recebido. Após as opiniões do grupo, o participante em questão lia em voz alta o discurso recebido. Um a um os participantes-dançarinos foram avaliados pelo grupo e revelando seus discursos. Ainda em rodoa li os trechos que selecionei da minha pesquisa bibliográfica e lancei a pergunta “Quais brechas poderiam ser utilizadas para desestabilizar a hierarquia de poder no contexto das danças de salão?
Avalio o experimento como satisfatório, apesar de resultados inesperados como a aparente rivalidade entre as duplas. Observei ainda que algumas pessoas não conseguiram agir de acordo com o discurso recebido, supondo eu que tenha sido devido as diferenças entre o discurso recebido e o seu próprio. A relação discurso verbal e coreográfico não foi investigada de forma satisfatória tanto pela escassez de tempo como pelo direcionamento dado por mim. A leitura dos trechos poderia ter sido suprimida, visto que não devem ter feito muito sentido para mais ninguém do grupo além de mim mesma.
Conheça os outros experimentos da minha turma no blog http://grandeslabs2009.blogspot.com/

8 de junho de 2009

Discursos Habitam Corpos

Experimento proposto por Evie Souto para a turma 03 do Laboratório de Corpo e Criação Coregráfica I, coordenado pelos professores Antrifo Sanches e Fernando Passos. Salvador, 25 de maio de 2009, Escola de Dança da UFBA.

30 de maio de 2009

Aulas na UFBA

As turmas na Escola de Dança da UFBA continuam sendo duas, porém sofreram alterações em seus horários e valores. A turma I acontece às terças-feiras, das 19h às 20h30 e já está acontecendo. A turma II acontece às quintas-feiras, também das 19h às 20h30 e ainda está para se formar. O valor da mensalidade é de R$ 50, 00 por turma. Experimente uma aula grátis!

29 de abril de 2009

Aulas na Escola de Dança da UFBA

A partir do mês de maio estarei dando aulas na Escola de Dança da UFBA (Av.Ademar de Barros, s/nº, Campus de Ondina. Entrada pelo portão principal, em frente à Rua do Zoológico).
Tenho construido uma proposta pedagógica diferenciada para as danças sociais a dois, onde os conteúdos, organizados em três módulos interrelacionados durante os exercícios, são: percepção corporal, percepção espacial e percepção musical. A metodologia se baseia na proposição de problemas como alternativa a imitação e repetição de “passos”. Dessa forma, pretende-se capacitar os indivíduos para uma prática criativa e crítica das danças sociais a dois.
As turmas serão plurinivelares, ou seja, os exercícios propostos respeitarão a evolução e conhecimentos prévios de cada aluno. Serão abordados as diversas linguagens ("ritmos") como bolero, tango, samba, forró, salsa, dentre outros, considerando o interesse do grupo. As aulas acontecerão as terças e quintas, das 18h-19h e das 19h-20h e o valor da mensalidade é de R$ 70.
Agradeço a todos que me prestigiaram com suas presenças na aula aberta do dia 28/04. Mas atenção: seu direito a uma aula experimental gratuita está garantido em qualquer momento!
Agradeço a quem puder divulgar!

Somos Contemporâneos de Nosso Tempo? Parte II – Construindo uma proposta pedagógica

“O grande desafio da didática na área de dança é repensar, pesquisar e propor formas de ensino condizentes com as propostas contemporâneas de educação...O que determina a escolha metodológica – consciente ou não - de um professor de dança é o seu estar no mundo, que reflete o seu pensar e agir em sociedade sobre corpo, dança e educação”. (Isabel Marques)

Na modernidade educar significava disciplinar a subjetividade e treinar os indivíduos, concebidos e tratados como passivos e uniformes, para obter cópias perfeitas do conjunto de “verdades incontestáveis e imutáveis”, socialmente legitimado como conhecimento. Estes modelos denominados positivistas propunham uma educação reprodutora, onde o fluxo de informação se dá apenas do professor para os alunos, que devem ser provar sua capacidade de reproduzir cópias mecânicas do conhecimento transmitido em um tempo médio estipulado por especialistas. Já nas perspectivas pós-positivistas, o conhecimento passou a ser concebido como “um processo dinâmico e encarnado em sujeitos e instituições sociais em interação com seu meio vital e em permanente transformação”, onde professor experimenta o papel de articulador e promotor de atividades e se propõe a existência de saberes em lugar das verdades eternas (1).

Segundo o relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI (1996), as práticas pedagógicas devem preocupar-se em desenvolver quatro aprendizagens fundamentais, os “quatro pilares do conhecimento”, que são: aprender a conhecer (abertura para o conhecimento que liberta verdadeiramente da ignorância), aprender a fazer (coragem de executar, de correr riscos, de errar mesmo na busca de acertar), aprender a conviver (desafio da convivência que apresenta o respeito a todos como caminho do entendimento) e aprender a ser (papel do cidadão e objetivo de viver) (2).

Essas e outras reflexões sobre dança, educação e contemporaneidade aconteceram na disciplina Arte como Tecnologia Educacional, componente do eixo pedagógico do Curso de Licenciatura em Dança da UFBA, que cursei como aluna especial durante o ano de 2008. Foi o inicio do meu processo de estruturação de uma proposta pedagógica para as danças de salão condizente com as propostas contemporâneas de educação e em consonância com os conceitos de corpo, dança e mundo.

Em seu texto “Metodologia para o Ensino de Dança: Luxo ou Necessidade?”, Isabel Marques diz que “os avanços na área de ensino da dança no país parecem ser ignorados pela grande maioria de artistas-professores, sugerindo a crença que a experiência artística determine a habilidade de ensinar”. Argumenta ainda que a utilização inadequada da terminologia da ciência educação por grande parte dos professores de dança é um dos fatores que revela o “despreparo pedagógico destes profissionais” e propõe uma comparação “geográfica” para a compreensão dessa terminologia, onde a didática seria o “mapa do território”, as metodologias as “vias de acesso”, os procedimentos metodológicos os “meios de transporte” para se chegar a um determinado local (objetivos) e os conteúdos as “cargas” que se quer transportar (3).

Salvo as peculiaridades de cada profissional, o processo de ensino-aprendizagem das danças de salão em Salvador têm como principal conteúdo seqüências de movimentos, denominadas “PASSOS”, que são transmitidos através da imitação, seja através da observação da própria imagem no espelho, seja pela observação da “estrutura correta” dos corpos de outro casal, e apreendida pela repetição dos mesmos. É comum nomear os “passos”, o que permite sua evocação verbal, ao mesmo tempo em que gera nomenclaturas regionalizadas, algumas vezes compreendidas apenas dentro de cada escola de dança.

Considerando os quatro pilares do conhecimento anteriormente citados, o objetivo maior da minha proposta pedagógica é capacitar o indivíduo para uma prática criativa e crítica das danças sociais a dois. Concordando que os alunos devem receber do professor “conhecimentos e incentivos para que possam experimentar e criar suas próprias danças” (3), organizei os conteúdos em três módulos: percepção corporal, percepção espacial e percepção musical. Durante os exercícios provoco reflexões sobre corpo, dança e mundo, a fim de promover a reconstrução crítica destes conceitos dentro da realidade da sociedade contemporânea e do contexto das danças de salão.

Elegi os princípios norteadores da metodologia “Dança no Contexto”, desenvolvida e proposta por Isabel Marques, como base para estruturar minha proposta pedagógica, a saber: problematização, criação de uma rede de conhecimentos, transformação dos conteúdos específicos da dança e postura crítica diante do mundo. Dessa forma, tenho substituído a imitação-repetição das sequências de movimentos pela proposição de problemas, utilizando não apenas recursos visuais, mas também táteis-cinestésicos, auditivos e metafóricos.

Minha prática pedagógica continua em permanente transformação e tem sido gratificante perceber transformações criativas nas práticas e críticas nos discursos de meus alunos sobre as danças sociais a dois.

REFERÊNCIAS

1. NAJMANOVICH, Denise. Para Novas Paisagens Educativas in “O Sujeito Encarnado – Questões para Pesquisa no/do Cotidiano”. Rio de Janeiro: DP&A, 2001

2. RODRIGUES, Zuleide Blanco. Os Quatro Pilares de uma Educação pra o Século XXI e Suas Implicações na Prática Pedagógica. Disponível em http://www.educacional.com.br/articulistas/outrosEducacao_lista.asp?artigo=artigo0056. Acesso em 13/11/2008

3. MARQUES, Isabel. Metodologia para o Ensino de Dança: Luxo ou Necessidade? in “Lições de Dança nº04”. Rio de Janeiro: UniverCidade, 2003.

5 de abril de 2009

Somos Contemporâneos de Nosso Tempo? Parte I - Buscando novas terminologias

No final do ano de 2007, ao apresentar um anteprojeto para o mestrado em dança da UFBA me deparei com a necessidade de definir o objeto “Dança de Salão”. Da minha primeira tentativa surgiu o seguinte:
“Dança de Salão (no singular) é a categoria de dança executada por casais, constituída de subcategorias, conhecidas como RITMO...”
Pedi então ao amigo Hugo Leonardo, que na época cursava o mestrado em dança, que fizesse uma revisão crítica do anteprojeto. Dentre as suas valiosas contribuições, ele sinalizou que, tal definição incluiria uma gama de outras categorias de dança, como ballet, jazz e dança flamenca onde existam casais dançando. Esse questionamento marcou o início das minhas buscas por terminologias mais adequadas às escolhas conceituais da minha proposta pedagógica em dança de salão.
Comecei experimentando algumas mudanças. A primeira foi colocar o objeto de estudo no plural, já que ele comporta “subcategorias” dentro dele. O passo seguinte foi substituir o termo “categoria” por “configuração”, mais apropriado com o pensamento contemporâneo em dança. Busquei então reconhecer as características comuns entre suas linguagens (os tais “ritmos”). Por fim, decidi delimitar o ambiente onde o objeto acontece. E foi assim cheguei à seguinte definição:
“Danças de Salão (agora no plural) é o nome pelo qual é popularmente conhecida a configuração de dança, caracterizada pela execução por casais vinculados pelos membros superiores (abraço), comunicação interpessoal codificada e transmitida através do sentido tátil-cinestésico (pressão-movimento), deslocamento espacial (trânsito) e forte relação entre o repertório musical e coreográfico, seja para fins de exibição artística ou competitiva ou de entretenimento social.”
Me pareceu bom. Será mesmo? Algo ainda me dava uma sensação de que tal definição ainda não era representativa da sociedade contemporânea brasileira em que vivemos. Busquei então compreender o contexto histórico do surgimento das danças de salão.
Nascida na França do século XV, as “danças da corte” representavam o modelo de gênero da época, surgindo como uma estratégia “socialmente correta” para aproximar social e fisicamente homens e mulheres. Sua linguagem masculinista e heteronormativa pressupõe como “natural” o homem “conduzir” a mulher na dança, que, por sua vez, reluz a sua competência do seu condutor. Os bailes, que aconteciam com muito glamour nos salões dos palácios, se constituíam em oportunidade de avaliação das “qualidades desejáveis” dos “pretendentes ao matrimônio”, como educação, gentileza, segurança, virilidade, suavidade, submissão, etc. Seis séculos depois séculos os salões de bailes migraram dos palácios para os clubes e discotecas. Nestes ambientes as gerações se misturam. O repertório musical é bastante variado. Pessoas que dançam a dois dividem espaço com outras que dançam sozinhas ou em grupo. As “leis de trânsito” foram transgredidas em trajetórias caóticas. E ao contrário do que diz Tim Maia, cada vez mais vale “dançar homem com homem e mulher com mulher”.
A partir destas observações percebi que o nome “Danças de Salão”, ainda que no plural, não mais dava conta de representar a diversidade nas formas de se relacionar a dois em nossa sociedade atual. Quais as mudanças necessárias na forma de pensar esta configuração de dança dentro do nosso contexto? Somos contemporâneos de nosso tempo? Depois de muito quebrar a cabeça, elegi o termo Danças Sociais a Dois em substituição a Danças de Salão, que defino como:
“Danças Sociais a Dois, popularmente conhecida como danças de salão, é o nome da configuração de dança caracterizada pela execução por duplas (não necessariamente um homem e uma mulher) vinculadas pelos membros superiores (abraço), comunicação interpessoal codificada e transmitida através do sentido tátil-cinestésico (pressão-movimento), deslocamento espacial (trânsito) e forte relação entre o repertório musical e coreográfico.”
Entretanto, a cada “baile” que vou tenho observado as pessoas experimentando novos acordos, como dança entre pessoas do mesmo sexo, inversão dos papéis de condutor e conduzido, dança em trio ou revezamento de duplas durante a mesma música. E vislumbro que, num futuro não muito distante, sinto que será necessidade rever meus conceitos e terminologias, afinal, o tempo não para!

4 de janeiro de 2009

Lambazouk

Apresentação livre de lambazouk com os professores Evie Souto e Gil de Souza em 17/08/2008 a convite de Ítalo Mandarino, organizador do evento Bailados na Noite, no salão do Quartel de Amaralina, Salvador, Bahia.

Mostra Dança em Processo 2008

Experimentação do projeto de práxis pedagógica "Diálogos no Escuro: uma metodologia não visual para dança de salão" como processo da disciplina Arte como Tecnologia Educacional II em 21 de outubro de 2008 durante a semana da Mostra Dança em Processo da Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia.

Experimentações Lambazoukeiras.wmv

Evie Souto e Gil de Souza experimentando movimentos no lambazouk durante o grupo de estudos sobre interfaces entre improvisação de contato e danças de salão com o professor David Iannitelli na Escola de Dança da UFBA.

Eu e a Dança: como tudo começou

Não existe presente sem passado: a forma como encaramos certas situações e objetos está impregnada por nossas vivências. Neste breve memorial desejo contar um pouco da minha trajetória de vida acadêmica e do meu envolvimento com as artes, em especial a dança, que resultaram nas minhas buscas atuais sobre o ensino e prática das danças sociais a dois.
Nasci em Salvador no ano de 1973 e, até onde minha memória permite, carrego em mim a necessidade permanente de expressão através do movimento. Meu “grande sonho”, como de muitas meninas da época, era fazer ballet clássico. Entretanto, aos sete anos fui rejeitada por uma academia de ballet, tendo sido considerada “pequena demais para a idade”. Tal frustração me fez abandonar o sonho da sapatilha cor-de-rosa e buscar outras formas de expressão artística, como jazz, ginástica rítmica, dança afro, suingue baiano, dança do ventre, teatro e canto coral.
Após concluir o ginásio, ingressei no curso técnico-profissionalizante em química pela Escola Técnica Federal da Bahia (atual CEFET), tendo concluído em 1991. Em seguida, por afinidade curricular ingressei na Faculdade de Farmácia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), me graduando em 1996. Durante toda a minha vida escolar necessitava significar as informações que estavam sendo “oferecidas” pelos professores, ou seja, a memorização acontecia não pela simples repetição, mas pela significação dos conteúdos. Paralelamente mantive a prática de atividades físicas e artísticas, especialmente a dança, para fins de saúde e entretenimento.
As Danças de Salão só entraram em minha vida em 1999, através de eventos conhecidos como baile-aulas em Salvador, onde então conheci o professor e dançarino Jayson França (atualmente com seu studio de dança em Maceió/AL), tendo sido sua namorada e parceira por três anos. Meu envolvimento com a prática pedagógica em danças de salão começou em 2002, motivada pela oportunidade de praticar gratuitamente ballet clássico, benefício concedido aos professores da Academia de Dança Maria Emília Clark, em Maceió/AL.
O sonho da sapatilha cor-de-rosa se tornou realidade durante um ano. Em julho deste mesmo ano participei do Curso de Aperfeiçoamento para Professores de Dança de Salão promovido pelo então Centro de Dança Jaime Arôxa, no Rio de Janeiro. O curso abordava aspectos técnicos, pedagógicos e comerciais, além de aulas de percepção rítmica aplicada à dança de salão. Foi o inicio dos primeiros questionamentos em relação aos conceitos e às metodologias de ensino utilizadas na dança de salão.
Em 2003, rompido relacionamento e parceria profissional, retornei a Salvador e comecei uma especialização em saúde coletiva outra vez na UFBA, onde tive contato teórico e prático com a pedagogia da pergunta de Paulo Freire, além da metodologia de planejamento estratégico-situacional. Paralelamente, tive contato com a metologia diferenciada do professor argentino Pablo Retamar, que nas suas aulas de tango reunia alunos de diversos níveis de conhecimento individualizando os exercícios voltados para a compreensão biomecânica dos movimentos e suas possibilidades. E os questionamentos continuaram a surgir. Em 2004 comecei a praticar contato de improvisação nas Jam Session coordenada pelos dançarinos Hugo Leonardo e Rossana Alves. A prática do contato de improvisação aguçou ainda mais minhas reflexões sobre a importância do sentido tátil-cinestésico para a comunicação e criação na dança de salão.
A idéia antropofágica não aceita passivamente andar pelos caminhos já cansativamente trilhados. Até 2006, mesmo sem fundamentação teórica, experimentei na minha práxis nas danças de salão conhecimentos adquiridos nas diversas áreas da dança que havia experimentado, além de buscar problematizar questões durante as aulas ou em discussões com outros profissionais da área. Em 2007, com o objetivo de fundamentar e transformar minha prática pedagógica em dança, ingressei na Escola de Dança da UFBA como aluna especial e cursei as disciplinas Danças Populares: Padrões em Evolução, Dança e Cognição (ambas do mestrado), além de Música e Ritmo (optativa da graduação). Em 2008 cursei o Módulo de Arte como Tecnologia Educacional I e II, pertencentes ao eixo pedagógico da graduação, além de formar com o professor David Ianetelli um grupo de estudo sobre princípios do contato de improvisação aplicado às danças de salão.
Nestes nove anos de observações, insatisfações, questionamentos e experimentações, continuo buscando aproximar o ensino e as práticas das danças de salão do contexto contemporâneo, através de reflexões sobre os conceitos de corpo, dança e mundo, sobre as transformações nas formas de se relacionar a dois que estão acontecendo em nossa sociedade e como isso tem se refletido nas formas se dançar socialmente a dois. Em 2009 pretendo continuar ampliando meus conhecimentos, dessa vez com as disciplinas Laboratório do Corpo, Laboratório de Criação Coreográfica e Estudos Crítico-Analíticos, além de dar continuidade ao grupo de estudo.