12 de março de 2013

Resenha crítica do vídeodança SOLO#1



Deslizar de luzes e sombras. Fade in, fade out para preto. Sons ritmados de engrenagens. Fade in, fade out para preto. Staccato/ Paulo Caldas e Alpendre apresentam SOLO #1. A câmera corre por sobre a grelha cênica e, como de dentro de um trem a baixa velocidade, o espectador começa a vislumbrar abaixo de tais trilhos a dançarina, ainda estática, entre as luzes e sombras que se movem por sobre ela. Zoom de aproximação sobre a dançarina que se movimenta e fica outra vez estática. Corte repentino e inesperado para novo ângulo. Estamos agora atrás da dançarina, e a vemos apenas dos ombros para cima. Ela move a cabeça lentamente. Corta. Outra tomada. Agora estamos na sua diagonal frontal à direita. A vemos de corpo inteiro. Ela se move lentamente até o ponto onde congela bruscamente em alguma posição. Corta. Novamente estamos acima, entre a grelha cênica e as varas. Corta, corta. Estamos novamente bem próximos a ela, dessa vez frente a frente. Em determinado momento, ela sai pelo lado esquerdo da tela, mas continua dançando, agora fora do alcance da câmera. De seus movimentos só nos chega os ruídos. Retorna pelo lado direito da tela e a vemos da boca até o umbigo. Dessa forma, câmeras, sombras e luzes editam a coreografia.

 

O videodança SOLO #1 mais uma vez aproxima coreografia e cinematografia enquanto escritas do movimento. Como em outras obras da companhia, utiliza como estratégia alguns “efeitos de cinema”, como cortse e fades, para compor tempo e espaço de modo a desfazer a continuidade usualmente experimentada diante da cena de dança. Aqui a luz enquadra e corta a cena, permitindo-lhe procedimentos de montagem em que os movimentos já não se sucedem segundo qualquer linearidade. O espaço editado exige que o olhar transite por sobre a cena e também para espaços anteriormente fora do quadro, deslocando lateralmente toda a cena.

 

Aos três minutos do vídeo entra o solo de piano, inicialmente monofônico, constituído por quatro e oito tempos de uma única nota. A idéia de ostinato, frase musical persistentemente repetida numa mesma altura, segue no crescimento da seqüência musical, que vai acumulando notas. Em determinado momento a trilha ganha polifonia, com sobreposição de duas, três, quatro melodias. A trilha ganha complexidade assim como a coreografia, apesar do minimalismo de ambas.

 

Movimentos lentos e mudanças bruscas executadas pela dançarina parecem sugerir as funções de aumento e redução de velocidade dos programas de editção de vídeo. O deslocamento lento, à revelia da tensão musical, me remeteu aos movimentos do Tai chi chuan, estilo de arte marcial reconhecido como uma forma de meditação em movimento.

 

A partir do minuto 8’45”, uma seqüência coreográfica é multiplicada no vídeo com imagens capturadas de distintos ângulos, resultando numa profundidade surreal nos moldes das construções impossíveis do holandês Maurits Escher, conduzindo a lugar algum, como em um labirinto. Em seguida, outra seqüência coreográfica é multiplicada no vídeo, novamente com imagens capturadas de distintos ângulos porém agora acrescida de uma pequena defasagem  temporal que resulta numa espécie de cânone tridimensional. A imagem desaparece, mas o ruído de fundo, contínuo e uníssono segue até o final dos créditos, sugerindo uma vez mais a idéia de infinitude presente nas obras de Escher.

 

SOLO #1 faz parte do conjunto de obras da companhia de dança carioca Staccato/ Paulo Caldas, que desde a década de 90 vem desenvolvendo uma freqüente e bem sucedida aproximação com a linguagem cinematográfica. O coreógrafo Paulo Caldas, além de diretor da companhia, é também idealizador e diretor do Dança em Foco - Festival Internacional de Vídeo & Dança (primeiro evento brasileiro dedicado exclusivamente à interface vídeo/ dança) e professor dos cursos de graduação em dança da UniverCidade e da Faculdade Angel Vianna, onde coordena o pioneiro curso de pós-graduação Estéticas do Movimento: Estudos em Dança, Vídeodança e Multimídia.


FICHA TÉCNICA:


Direção: Alexandre Veras e Paulo Caldas
Coreografia: Paulo Caldas
Edição: Alexandre Veras
Bailarina/ Pesquisa de Movimento: Carolina Wiehoff
Câmera: Alexandre Veras e Lucas Rodrigues
Assistente de Câmera: J.Estolano
Maquinista: Rodrigo Dias
Coordenação Técnica: Luciano Faustino
Produção: Staccato / Paulo Caldas
Parceria: Centro Coreográfico do Rio de Janeiro e SESC Rio de Janeiro


Resenha crítica do videodança SOLO#1, de Stacatto/ Paulo Caldas, apresentado como avaliação da disciplina Estudos Monográfico sobre Tópicos em Dança, sob orientação da professora Márcia Mignac, em 2012-2. Disponível em < http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=_UO_uykfnV0>. Último acesso em 05/02/2013

Resumo do artigo “Transposição da Linguagem Coreográfica dos Salões para os Palcos”,



Em “Transposição da Linguagem Coreográfica dos Salões para os Palcos”, artigo apresentado no IV Colóquio Internacional de Etnocenologia da UFMG, Jomar Mesquita chama a atenção para a insipiência das pesquisas artísticas que utilizam as danças de salão como técnica de base para as suas criações coreográficas como conseqüência de alguns equívocos durante tal processo de transposição. Segundo Mesquita, os espetáculos de danças de salão frutos de pesquisas artísticas surgiram somente no final do século XX e, em sua opinião, a maioria dos grupos e companhias ainda não conseguiu se desvencilhar da reprodução do formato de baile, resultando quase sempre em produções cafonas, no estilo de show para turista, enquanto outros grupos perderam seu foco de pesquisa por se deixarem influenciar demasiadamente por outras técnicas de dança. Entretanto, o autor aponta para a emergência de algumas experiências bem sucedidas em preservar a base da linguagem coreográfica dos salões de forma inovadora e contemporânea, através da desconstrução e releitura de suas tradições, como tem feito a Mimulus Cia de Dança de Belo Horizonte. Denominada por alguns críticos como dança de salão contemporânea, a Mimulus Cia de Dança, na qual Mesquita atua como dançarino, coreógrafo e diretor, tem se apresentado e recebido premiações em renomados festivais internacionais de dança contemporânea devido à inovação da linguagem e ao tratamento profissional dado às suas produções. Enfim, Mesquita termina seu artigo lançando reflexões sobre os possíveis efeitos de tais transposições de linguagem coreográfica dos salões para os palcos: destruição de uma cultura popular ou transformação em uma nova e rica vertente da dança contemporânea?

Resumo acadêmico do artigo "Transposição da Linguagem Coreográfica dos Salões para os Palcos” de Jomar Mesquita, apresentado como avaliação da disciplina Estudos Monográfico sobre Tópicos em Dança, sob orientação da professora Márcia Mignac, em 2012-2. Artigo disponível na íntegra em < http://mimulusciadanca.wordpress.com/tag/artigo/