Faltam apenas duas semanas para o final deste semestre letivo na UFBA. UFA! Não vejo a hora de ficar de férias! Estou realmente cansada, exausta, pois mergulhei fundo em cada um dos quatro componentes curriculares que me matriculei. Sei que quatro parece pouco, mas em se tratando de UFBA, é overdose. A partir de agora, apenas duas, ou no máximo três disciplinas por semestre.
O texto que posto a seguir apresentei como última avaliação da disciplina Estudos Críticos Analíticos III, sob orientação de Daniela Amoroso e Helena Katz...Sim, ela mesma, Helena Katz em carne, osso e SKYPE! Explico o porque da minha tietagem. É praticamente impossível passar pela Escola de Dança da UFBA sem se deparar com o nome de Helena Katz, seja como autora de textos, de prefácios de livros, seja como referência de algum texto lido. Aliás, ela foi meu pé de coelho nas vagas residuais como contei em outra postagem, me salvando durante a avaliação textual, quando, por erro de comunicação, eu só tinha lido um dos três textos indicados. Durante o sorteio do ponto, eu clamei em silêncio a Helena e ela me atendeu. Por esta e outras razões eu digo: obrigada Helena!
Por razões diversas, em grande parte das nossas aulas Helena participou via Skype. Apesar das dificuldades técnicas, a sinergia entre as professoras (que ainda contou com a colaboração da então mestranda Lauana) fez com que ECA III se transformasse em um sucesso de bilheteria. Vocês foram nota 10!
QUESTÃO: DENTRE AS ABORDAGENS CRÍTICO-ANALÍTICAS QUE TRABALHAMOS, QUAL A QUE MAIS LHE INTERESSOU? POR QUÊ? EM QUE MEDIDA ELA NOS AJUDA A PENSAR A PRODUÇÃO ARTÍSTICA DE HOJE?
TODAS! Cada um dos conteúdos, sem exceção, me despertou grande interesse. Primeiramente, pela maneira como foram abordados, voltados sempre para a compreensão da construção artística contemporânea em dança no Brasil. Os muitos e diversos textos escolhidos foram discutidos considerando suas realidades (temporais e geográficas) e atentamente relacionados com o contexto ao qual estamos inseridos. Apesar de organizadas em seis blocos, cada nova discussão foi se costurando com as discussões anteriores. O sucesso de tal contextualização resultou para mim em um grande bloco coeso de conhecimentos tão fortemente interligados entre si que qualquer tentativa minha em dissociá-los resultaria inevitavelmente em danos.
Entretanto, por questões práticas, selecionei o bloco das abordagens pós-coloniais para refletir sobre a produção artística em dança, pois considero que começar as discussões por este bloco foi uma estratégia de sucesso para manter o foco sobre a nossa realidade artística durante todo o semestre. Para isso, utilizei as anotações que fiz em meu caderno durante as aulas e me permiti correr o risco de experimentar um formato de escrita que se aproxime da organização caótica das minhas lembranças. Ou seja, mais dúvidas do que respostas...
As linhas de Boaventura separam o tudo do nada; o visível do invisível; o que existe do que não deve existir. Que discursos e atitudes colonizadoras geram invisibilidades? Com quais linhas abissais tenho me deparado enquanto “estudançarina”? Que abismos tenho construído com minha prática artística-pedagógica? Tenho sido ao menos capaz de reconhecê-las? Ações-com-clinamem: estratégia de resistência à opressão do discurso colonizador. Que desvios posso criar para subverter as dificuldades com que me deparo? Afinal, a contemporaneidade na dança é uma questão de atitude e não de técnica em si.
Mestiço, híbrido ou crioulo? Afinal, que corpo eu tenho (ou preciso ter) para ser uma dançarina contemporânea? Que tipo de treinamento preciso? Como fazer bem? Reflexões e confusões vão impregnando seriamente a turma...Qual o termo mais apropriado para falar do corpo colonizado que dança na contemporaneidade? Mais importante do que a carga etimológica do termo escolhido é estar atenta para utilizá-los livre dos discursos subordinados a noções de origens, raízes, essências e tradições. É não ter medo de se tornar poroso. È estar disposto a se contaminar com as informações do mundo que nos rodeia física e virtualmente. É aceitar o conflito oriundo da justaposição dos diversos “alimentos” culturais que antropofagicamente digerimos e metabolizamos para tornar nosso. É conviver com as tensões das diferenças sem necessidade de anulá-las. É aprender a misturar sem deixar dissolver.
Então aparece Lepecki e problematiza a dança contemporânea, arte que se deseja ser um “pensar em ação”, desde a década de 1960. Lançando-se para fora das cadeias disciplinantes da técnica, a Dança Contemporânea volta sua atenção à materialidade social do espaço circundante, produzindo ações de resistência. Entretanto, a vontade cega de mover-se sem prestar contas a ninguém, de entrar no movimento pelo movimento, de reproduzir sem produzir, resulta na propagação de clichês e conseguem subjugar ainda mais os corpos que se acreditam “descolonizados” às lógicas neocolonialistas ocultas sob a democracia da globalização. Cuidado com o chão onde se dança, provoca Lepecki! E propõe uma política física e ideológica do chão impecavelmente liso onde a dança nasceu e parece ainda preferir acontecer. Chão terraplanado pelo colonizador, que oculta fantasmas que a história enterrou sem cuidados. Até que, mais dia menos dia, dele emergem seus relevos indesejáveis, tais como dentes no sorriso do lobo (são para te comer melhor...). - Olha o preto!, sopra o lobo e põe abaixo Frantz Fanon. Em quantos relevos devo tropeçar sem (querer) me dar conta?
O desafio: pensar/fazer dança dentro da nossa realidade pós-colonial globalizada, com “corpos googles” a dançar pela cyberesfera, ávidos por informações e sujeitos aos refinados controles sociais. Como não ser clichê na civilização dos clichês?
Texto elaborado para a quarta avaliação do Módulo Estudos Críticos-Analíticos III sob orientação das professoras Daniela Amoroso e Helena Katz em 2011-1
Que bom saber que nosso curso foi proveitoso pra você, Evie. Sua colaboração foi central para que ele fosse a nota 10 que você atribuiu.
ResponderExcluirUm beijinho do seu pé de coelho (adorei saber disso)